Reproduzo excelente post do dr. Marcio de Figueiredo, UNICAMP, sobre a relação entre os marcapassos e a renuncia papal.
Carnaval, tempo para a folia de uns, descanso e reclusão de outros… E
nesse ano, nada sugeriria que fosse diferente, até que…
O Papa renunciou! Estávamos todos acostumados com a ideia de sucessão por
falecimento do Santo Padre – a última renúncia foi a do Papa Gregório XII (1406
a 1415), há quase 600 anos. Esta, então, deixa a todos aturdidos e buscando
explicações.
Imediatamente,
autoridades eclesiásticas e estudiosos tentam achar explicações, entre elas o
estado de saúde e as implicações na função de Chefe da Igreja, com viagens e
compromissos internacionais. E, em meio dessas notícias, nos deparamos com uma
informação surpreendente: o Papa tem um marca-passo! Mais ainda: foi recentemente
submetido a uma pequena cirurgia para a troca da bateria do aparelho! Será que,
enfim, esse é um motivo para o ocorrido?
Não, não é. É bom
esclarecer o assunto, já que é um erro comum que nós, especialistas em
alterações do ritmo cardíaco, nos deparamos, isso sim, diariamente. E, por
isto, se faz necessário explicar à população leiga sobre os implantes de
dispositivos implantáveis, como marca-passos e desfibriladores (CDIs).
Especificamente para este
caso, vale uma curta e objetiva explicação: O que é um marca-passo? O coração
tem um sistema elétrico natural, que comanda o ritmo cardíaco todos os dias,
ininterruptamente, desde antes do nascimento. Mas esse sistema pode apresentar
falhas, por desgaste ou até mesmo por problemas antes do nascimento. Nesses
casos, o coração pode bater mais lentamente do que o necessário, podendo
acarretar em riscos para a saúde ou para a vida. Assim, na metade do século
passado foram desenvolvidos aparelhos implantáveis que, através de circuitos eletrônicos,
garantem o ritmo cardíaco. Com o tempo, os aparelhos foram aperfeiçoados, e os
mais modernos têm novas funções, como a possibilidade de tratamento de paradas
cardíacas, ou que auxiliam alguns casos de enfraquecimento do músculo cardíaco.
Essas pequenas maravilhas
da tecnologia, que normalmente têm o tamanho de uma bateria de telefone
celular, salvam milhões de vidas no mundo todo. Na Unicamp, assim como em
vários hospitais no Brasil e no mundo, os implantes são procedimentos
rotineiros. E, periodicamente, é feita a análise por aparelhos especiais, que
indicam, inclusive, qual o momento da troca da bateria, que é feita através de
um procedimento cirúrgico relativamente simples.
Mas é comum relacionar a
prótese a incapacidades físicas e laborais, embora na maior parte dos casos
isso não ocorra. Quando é indicada a colocação do aparelho, o objetivo é fazer
com que o paciente retome uma vida praticamente normal. Existem pequenas
limitações, sim, que são explicadas pela equipe ao paciente ou aos familiares.
No entanto, o que muitas vezes ocorre é a progressão da doença que levou ao
aparecimento do distúrbio do ritmo. Nesses casos, o prognóstico depende da
doença cardíaca, e não do uso do marca-passo.
Deve haver, portanto,
outras causas para a renúncia. A profundidade do debate, e o interesse sobre o
tema, dependem de cada um. Mas estou certo de que o Papa fez sua escolha com
liberdade e sabedoria. E espero que ele continue com saúde e com a pilha nova:
o marca-passo poderá ajudá-lo nessa nova fase!